domingo, 14 de agosto de 2011

MECÂNICA QUÂNTICA: SUA HISTÓRIA, ALGUMAS INTERPRETAÇÕES E POSSÍVEIS IMPLICAÇÕES




PARTE 1

A pedido de muitos colegas e amigos, fiz este post para tentar esclarecer alguns conceitos da mecânica quântica. Venho reparando que, a um bom tempo fala-se muito dela, mas muitas vezes de maneira errônea. Muitas pessoas, das quais pouquíssimas são físicas, a enfeitam mais do que ela, por si só, já é. Várias interpretações passaram a ser mais opiniões próprias do que de fato a teoria diz.

Isto acaba sendo muito perigoso, fugindo do que realmente consiste a ciência, pois opiniões que não tenham base científica nada mais são que argumentos vazios. Não vamos confundir religião e ciência, em que a primeira toma as verdades como absolutas, sem reais questionamentos e muitas vezes são para agradar o homem e a segunda que toma a verdade não sendo como absoluta, embora a busque, e também onde a natureza das coisas não faz nada para nos agradar.
Sinto-me mais apto e confiante para falar um pouco do assunto, pois além de ter estudado superficialmente na faculdade, acabei de cursar Mecânica quântica 1, e no atual momento estudando Mecânica quântica 2, no curso de pós graduação no Instituto de Física Teórica-UNESP, instituto de renome internacional e um dos melhores lugares para se fazer física no Brasil, senão o melhor.

Vou dividir este post em quatro partes, para que não se torne cansativo e dê para discutir seus principais conceitos. As duas primeiras mostrarei sua origem, evolução e algumas implicações, na terceira, descreverei superficialmente os dois experimentos que marcaram a história da MQ e na última, algumas de suas interpretações. Tentarei ser o máximo possível neutro e expor o mínimo de minhas opiniões para que possamos atingir o objetivo de entendê-la sem falsos conceitos.

HIPÓTESE DE PLANCK
Max Planck, em meados de 1899, atentou-se para a explicação da interação da luz com a matéria: como um metal emite luz e como a luz é absorvida pela matéria.
Usando o que se sabia na época da teoria termodinâmica e eletromagnetismo ele derivou uma fórmula que descrevia o poder de emissão de energia, na forma de radiação, pelo corpo. Ao usar sua fórmula clássica, onde era necessário integrar sob todas as formas possíveis de freqüências da radiação emitida, ele chegou a um resultado sem sentido em que a energia radioativa era prevista ao infinito.

Planck foi capaz de evitar essa conclusão somente pela introdução de um mínimo valor de energia, no qual pode existir para qualquer valor de freqüência de radiação, o quantum. Assumindo que a luz pode ser absorvida pela matéria somente por múltiplos de quantum, conseguindo assim derivar a fórmula correta para predição para a total energia emitida por um corpo quente. Veja que aqui já saímos do conceito clássico de que todos valores de energia poderiam existir para que um corpo pudesse emitir ou absorver radiação. A fórmula derivada para a energia foi : E=hѵ,
onde h é sua famosa constante, a constante de Planck e ѵ a freqüência de radiação emitida ou absorvida por um corpo.

EXPLICAÇÃO DE EINSTEIN PARA O EFEITO FOTOELÉTRICO
No mesmo ano em que Einstein formulou a teoria da relatividade, 1905, ele explicou como um metal pode emitir elétrons pela emissão de luz sobre ele, o chamado efeito fotoelétrico, o qual lhe rendeu o prêmio Nobel. Planck, que acabei de citar, sugeriu que apenas a luz na interação da matéria poderia revelar o comportamento quântico em baixas energias. Einstein propôs que toda a luz existente está em quanta de energia, concluindo que:
  • Os elétrons precisavam de uma energia mínima para escapar do metal.
  • Ao aumentarmos a freqüência de luz os elétrons deixam o metal com maior energia cinética.
  • A energia dos elétrons emitidos depende somente da freqüência de luz e não da intensidade. E o número de elétrons emitidos depende somente da intensidade, mas não da freqüência.
Einstein demonstrou que esse resultado experimental poderia ser explicado se a energia da luz fosse quantizada em pequenos pacotes chamados fótons.
  • Equação de Einstein para a energia do fóton: E=hν, em que h é a constante de Planck e ν é a frequência da luz.
Através do efeito fotoelétrico, Einstein confirmou a teoria quântica da luz além de sua teoria corpuscular. A grande questão aqui é, será que você entendeu o porquê da teoria quântica e do fenômeno corpuscular?? Explicarei melhor. Até então a luz era considerada apenas como uma onda, pois os fenômenos de difração, quando a onda passa por uma fenda, que seja aproximadamente do tamanho de seu comprimento de onda, uma nova frente de onda é gerada, e o fenômeno de interferência, quando ondas coerentes interagem, somando seus picos ou até anulando-se, eram bem explicados. Se de fato a luz ao interagir com o metal, tivesse o comportamento de onda, e nesse caso continuaria sendo um fenômeno clássico, com o aumento de sua intensidade esperar-se-ia um aumento de forma contínua da energia da luz. É como ocorre com o vento interagindo com a nossa face, apesar de ser composto de moléculas uma pessoa não consegue percebê-las, pois essas interações de bilhões de partículas parece ter uma forma contínua, como ocorre numa onda, ou seja, mesmo para a luz formada por partículas ela poderia exibir um fenômeno clássico assim como o vento. Mas, isto não ocorre. Vemos que a luz está quantizada, ou seja, possui valores discretos, não sendo mais qualquer valor permitido para a sua energia, não contínuo como se esperava.



  Figura 2: Temos um experimento simples da luz, mostrando os seus dois fenômenos característicos do comportamento de onda. Por cada fenda que a luz entra, uma nova frente de onda é gerada, e à medida que elas se deslocam, por serem coerentes, o fenômeno de interferência ocorre.


Figura 3: Neste desenho, temos uma visão clássica de como uma radiação eletromagnética, não se esqueça que a luz visível é também uma radiação, se propaga pelo espaço. Temos um arranjo de campos elétricos e magnéticos, sempre viajando perpendicularmente um em relação ao outro. Essas curvas, que se chamam senóides, mostram as intensidades dos respectivos campos ao longo do espaço.


Figura 4: Temos uma representação esquemática do efeito fotoelétrico. Neste esquema a luz está representada por fótons. No desenho da esquerda temos uma luz vermelha interagindo com um metal, neste caso os fótons não possuem energia suficiente, não importando sua intensidade, ou seja, o quão  brilhante está, para retirar os elétrons do mesmo. No desenho do meio, temos uma luz azul interagindo com o mesmo metal, neste caso há energia suficiente para arrancar os elétrons. E por fim temos uma luz ultravioleta, que por possuir fótons mais energéticos, que libera o mesmo número de elétrons, mas com maiores energias cinéticas. 

Cada elétron ganha energia por colisões entre fótons, caracterizando o comportamento de partícula da luz. Veja que temos algo diferente da previsão clássica, pois ao aumentarmos a intensidade de luz aumentamos a quantidade de fótons emitidos, entretanto, com seus pacotes de energia sendo a mesmo. Lembrem-se na onda clássica, com o aumento da intensidade temos o aumento de energia.

Temos então o surgimento de um estranho paradoxo, pois a luz, então, passou a ser vista como partícula e onda, e para resolvermos isso deve-se introduzir uma nova entidade na qual reduz partícula e onda em diferentes circunstâncias. Isso será explicado mais para frente.

Muitas pessoas não sabem, mas a luz visível é uma radiação eletromagnética, assim como raios-x, radiação gama, radiação do infravermelho e assim por diante. O que a torna perigosa é o fato dela poder ionizar um átomo ou não, e quando isso ocorre, ela é chamada de radiação ionizante. O fenômeno de ionização de átomos, que pode ser dado pela colisão entre os fótons e os elétrons, já era descrito, de maneira incompleta, antes mesmo da explicação do efeito fotoelétrico, uma vez que da teoria do eletromagnetismo a radiação eletromagnética é composta por campos elétricos e magnéticos, viajando sempre com direções perpendiculares entre si, de uma maneira ondulatória, isso é uma visão clássica da radiação eletromagnética, pois na verdade são fótons. Com isto, a explicação para ionização dos átomos, vista classicamente, é que quando uma radiação que possui um alto campo elétrico, este pode retirar os elétrons do átomo uma vez que cargas elétricas ao interagirem com o campo elétrico são forçadas.

O efeito fotoelétrico é aplicado em diversas áreas, como por exemplo para tratamentos de tumores, na radioterapia, usando feixe de fótons para eliminar tumor, ou seja, radiação eletromagnética com uma visão quântica. Podemos usar também para detectores de radiação, quando o fóton da radiação interage com o detector e consegue arrancar um elétron, gerando uma corrente. O detector mede isso.

O ÁTOMO DE BOHR

Até o momento, os átomos eram descritos classicamente pela visão de Rutherford, que era a seguinte: elétrons orbitam a pequenas, massivas e positivas cargas (núcleo) localizado no centro, de maneira similar aos planetas orbitando o Sol. Entretanto, esse modelo gerava grandes problemas, pois pela teoria clássica do eletromagnetismo, todas as cargas que sofrem aceleração devem emitir radiação eletromagnética. Sendo assim para o átomo de Rutherford a radiação deve ser emitida constantemente, veja que mesmo os elétrons com velocidades mantidas constantes em órbita estão sendo constantemente acelerados, pois mudam de direção constantemente, pela força centrípeta. Isto representa a perda de energia do elétron que resultaria em um movimento espiral descendo para menores órbitas e eventualmente até o seu próprio núcleo. Mas, isso não ocorre!!! Devido ao fato de que o modelo do átomo era inconsistente, foi necessária uma nova abordagem.

Em 1913, Bohr sugeriu uma teoria quântica do átomo, resolvendo o problema do colapso da radiação dos átomos, explicando a emissão e a incorporação de luz destes, incorporando as idéias quânticas de Planck e Einstein.
Sua proposta foi a seguinte:
  • Os átomos podem existir somente em discretos quantas de estados, separados uns dos outros por diferença de energia finita.
  • As órbitas permitidas são especificadas naquelas nos quais o momento angular é quantizado .
Veja, o que ocorre o tempo todo ao nosso redor é isso. A luz, por exemplo vindo de uma lâmpada amarela comum, é gerada pelo aquecimento do filamento, devido sua resistência elétrica, na medida em que a corrente elétrica passa por ela, excitando seus elétrons até novas órbitas eletrônicas. Quando o elétron retorna para o seu antigo estado ele emite o fóton, ou seja, a luz. Quando esse fóton interage com vc ele, novamente, excita seus elétrons e estes ao voltarem, para alguma órbita menor do que quando estavam excitados, emitem luz com diferentes energias, ou seja, diferentes freqüências, (diferentes freqüências diferentes cores.) caracterizando ao mundo a sua imagem! É a partir disto, meus amigos, que o mundo ao seu redor passa a ser visível.

É claro que há uma infinidade de maneiras de interações da máteria com a radiação, como o efeito Thompson, fotoelétrico...além de mudanças vibracionas  em moléculas. E todas estas contribuem para as radiações emitidas no dia a dia.

Muita atenção agora, o átomo está quantizado, ou seja, não é qualquer posição que o elétron pode ficar em relação ao núcleo, por não poder possuir qualquer valor para seu momento angular e quando passa de um nível eletrônico a outro, ele não caminha como uma partícula clássica até esse nova posição, ou seja, passando por todos os pontos do espaço, ele simplesmente pula de um nível ao outro, é o que chamamos de salto quântico.


Figura 5: Esquema de como um átomo absorve luz. O elétron absorve o fóton e com isso vai para um nível energético maior.



Figura 6: Agora temos um esquema de emissão de luz. Quando o elétron, que encontrava-se em um nível excitado, retorna para um nível menos energético ele emite luz.


Figura 7: Este é um esquema simples de como ocorre ionização de uma átomo pela radiação eletromagnética. Um fóton com muita energia consegue desprender o elétron do núcleo, fazendo com que este fique positivo, afinal perdeu uma carga negativa.

Figura 8: Diagrama de níveis de energia do átomo de hidrogênio. Os valores de n, indicam os níveis energéticos os quais os elétrons se encontram. Note que n não assume qualquer valor, o que reflete a não existência de qualquer valor energético dos elétrons e de seus raios, em um dado núcleo. Isso reflete a não existência de qualquer valor de energia dos fótons. Isso se chama quantização. Essas flechas mostram os níveis  que os elétrons estão e para onde eles retornam, e com isso emitindo fótons com diferentes energias.

A Hipótese de de Broglie
Considerando que a luz demonstrava ter propriedades ondulatórias e corpusculares seria natural perguntar se a matéria (por exemplo elétrons e os prótons) também apresentava tais características. Em 1924, um estudante francês de física, Louis de Broglie sugeriu essa idéia em sua tese de doutorado. Seu trabalho foi altamente especulativo, uma vez que até o momento não havia evidências sobre o caráter ondulatório da matéria.

    Para o comprimento de onda relativo ao elétron, de Broglie apresentou a seguinte relação.
  • Equação de de Broglie para o comprimento de onda relativo ao Elétron: λ = h/p, onde λ é o comprimento de onda do elétron , h a constante de Planck e p o momento do elétron.
Muita atenção agora!!! Acredita-se que essa equação pode ser aplicada para toda matéria. Porém, para corpos macroscópicos os comprimentos de onda calculado através dessa equação são tão pequenos que se torna impossível observar as propriedades ondulatórias habituais de interferência e difração. Vamos a um exemplo.
    Vamos calcular o comprimento de onda de de Broglie relativo a uma partícula de 10-6 g, veja bem 0,000001g !!! (uma partícula de poeira)se deslocando com uma velocidade de 10-6 m/s. Usando h= 6.63 X 10-34 J.s (joule vezes segundo), então:
6.63 X 10-34 J.s/(10-9 kg)( 10-6 m/s)= λ= 6,63 X 10-19m.
   
Novamente aqui, preciso de sua atenção. O que esse valor tão pequeno do comprimento de onda quer dizer?? Significa que para que haja o comportamento de onda para essa partícula, necessitamos de uma abertura ou obstáculo dessa magnitude para que tenhamos os fenômenos de difração e interferência. Você imagina qual é o valor aproximado do diâmetro de um núcleo atômico??? É na ordem de 10-15 m, ou seja, o raio atômico é 10.000 vezes maior do que a abertura que precisamos. Imagine, então, o tamanho da abertura necessária para o comportamento de onda bola de bilhar.
   
Em 1927 Clinton Davisson e Lester Germer demonstraram que os elétrons podem ser difratados, através de uma estrutura de treliça de cristal, de maneira similar a difração da luz através de uma grade.
   
A adoção das idéias de Broglie requer uma compreensiva assimilação da dualidade onda partícula. Para qualquer entidade do mundo microscópico deverá haver situações nas quais a melhor maneira será como onda e situações em que a melhor maneira será como partícula. Nem uma nem outra é uma representação da realidade pois ambas são produto da imaginação macroscópica humana!!!
   
Função de onda de Schrödinger
Seguindo diretamente as idéias de de Broglie o físico austríaco Erwin desenvolveu a idéia de ondas de partículas em uma mecânica de onda própria. O ponto inicial dele foi essencialmente a equação de onda  descrevendo o comportamento das ondas de luz no espaço tempo. Assim como é uma representação precisa do fenômeno óptico, ele formulou a equação de onda de matéria, a qual ele forneceu  uma representação precisa do comportamento da matéria. A equação de Schodinger descreve partículas por autofunções e continua a mostrar como essa autofunção da partícula evolui no espaço tempo sob específicos conjuntos de circunstâncias.
   
Uma outra circusntacia bem interessante é a idéia de um simples elétron movendo-se sobre um campo elétrico de um próton, usando essa equação de onda ele foi capaz de assumir que as funções de onda dos elétrons podem assumir somente certos níveis discretos de energia, ou seja, não permitindo qualquer valor, e que esses leves níveis de energia são precisamente os mesmos da energia de uma órbita eletrônica do átomo de hidrogênio postulado anteriormente por Bohr.
   
A função de onda tem uma grande importância que é a expressão matemática para descrever todos os comportamentos observáveis das partículas. Colisões entre partículas não são mais necessariamente vistas como algum tipo de comportamento de bola de bilhar, mas como interferências de funções de onda, dando origem a efeitos de fenômenos de interferência um tanto parecido como da óptica.
   
A partir disso, nos surge várias questões: qual o verdadeiro significado da função de onda? Devemos pensar que o eletron é uma esfera localizada de matéria ou alguma extensão de onda ? Afinal, o que são as ondas de matéria? Deixaremos para responder estas perguntas na próxima parte.

 

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